Encontrar a pessoa certa dá um trabalhão. O Mister Right ou a Miss Perfection são mitos insondáveis, produtos híbridos e ambivalentes, frutos da nossa imaginação misturada com as nossas ambições, os nossos medos, o nosso passado, o património genético que herdámos e os padrões que se foram colando à nossa pele. E como se isso não bastasse, o ideal da Pessoa Certa vai sofrendo alterações ao longo da vida. O que nos parece perfeito ao 18 anos nunca é o que o que desejamos aos 28, muito menos aos 38.
Não acredito que a pessoa certa exista. Nem a metáfora das laranjas, por mais bela e poética que seja, me convence de que existe uma alma gémea. Acredito que existe a Relação Certa, aquela relação com uma pessoa que nos faz sentir felizes, protegidos e completos, quer para um lado, quer para o outro. Acredito em relações complementares entre pessoas de idades diferentes e vivências diferenciadas. Acredito no entendimento entre pessoas de países distintos entre idiomas variados desde que exista uma base cultural próxima. Acredito em relações em que mulheres muito belas escolhem homens apagados por verem neles mais do que o aspecto físico. Acredito em relações de homens mais velhos com mulheres mais novas e em relações de homens novos com mulheres mais velhas. Acredito que pode existir perfeição num entendimento homossexual. Não acredito em relações em que os homens tratam as mulheres como sua propriedade ou quando as mulheres usam os parceiros sem qualquer respeito por eles.
E o que fazer quando se encontra a Relação Certa? É aqui que entra o trabalho de manutenção: depois de encontrar o Mister Right, é preciso verificar com frequência se ele está mesmo alright ou se pós maléficos se vão infiltrando na engrenagem. Às vezes somos nós que nos fartamos da outra pessoa. Começamos a embirrar com a forma de andar, com o ruído que faz a sorver o café ou com o tique de piscar os olhos demasiadas vezes por minuto. Outras vezes é o nosso parceiro que se desinteressa de nós, ou da vida que tem connosco. A rotina é um pau de muitos bicos; pode trazer estabilidade ou parar as águas para sempre. Há quem não viva sem rotina, há quem sufoque com esta. E há quem tenha pela rotina sentimentos contraditórios: precisa dela, mas detesta-a.
Dá trabalho encontrar a Pessoa Certa porque ela não é um ideal imaginado mas uma realidade construída. A Pessoa Certa só vence se trouxer consigo a Relação Certa. E as relações constroem-se todos os dias com bom senso, generosidade, imaginação, entrega e amor. Não há receitas nem na literatura nem no divã do psiquiatra, truques de bruxaria, ou soluções na última página do suplemento. O entendimento é um processo alquímico, nem tudo do que este é feito depende da nossa vontade. Mas para lá de tudo isto reside uma verdade que bate qualquer argumento: a Pessoa Certa para nós só o pode ser se, ao olhar para nós, vir a Pessoa Certa para ela.
Margarida Rebelo Pinto,in "Onde reside o amor",pag87/88
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